E$porte e Mídia: Quando o bispo quer ser rei

Estima-se que a Rede Record desembolsou cerca de 60 milhões de dólares pelos direitos de transmissão em todas as mídias dos Jogos Olímpicos de 2012. Estima-se pois nem o Comitê Olímpico Internacional nem a Record divulgaram o valor. E quando se fala em todas as mídias leia-se TV aberta, por assinatura, internet e telefones móveis. A emissora paulista também levou no pacote os direitos pelos Jogos Olímpicos de Inverno que serão realizados em Vancouver.

A Rede Record recentemente adotou como slogan a frase "A caminho da liderança". E nesta década a emissora tem investido em várias áreas, não somente no esporte. É interessante notar que autores de telenovelas conhecidos do público como Ana Maria Moretzhon e Lauro César Muniz já escreveram folhetins para emissora bem como alguns atores tidos como globais já preenchem os quadros da emissora da Barra Funda. Vale lembrar que em 2006 o folhetim Prova de Amor bateu (por alguns minutos, mas bateu) o Jornal Nacional em audiência. Se levarmos em conta que o JN mantem uma liderança sólida há anos, isso certamente conta como mais um cabelo branco do já grisalho William Bonner.

Mas esta é sobretudo uma coluna esportiva, então nos reportemos ao ano de 2002. Este ano seria o primeiro da Record fazendo transmissões esportivas de peso numa parceria com a Traffic de J. Hawilla que recentemente havia deixado a Bandeirantes. Nesse ano a Record transmitiu o Torneio Rio-São Paulo (vale lembrar que nesse ano o torneio estava fortificado), alguns amistosos da seleção brasileira, o Campeonato Brasileiro, a Copa do Brasil e a finada Copa dos Campeões que se jogava no Nordeste. Milton Neves veio nesse balaio se transferindo da rede dos Saad para a rede de Macedo. Ao final desse primeiro ano a Traffic não mais trabalharia com a Record e esta teve que buscar outra parceira para continuar as transmissões esportivas

A parceira seria ninguém menos que a própria Rede Globo que passaria a dividir os eventos com a Record. Porém, da postura de desafiante a Record passou a ter uma postura de subserviência uma vez que a rede paulista teria que se submeter a transmitir os mesmos jogos que a Globo aos domingos e de vez em quando poder fazer uma transmissão diferente às quartas-feiras. E assim a situação se manteve até o final do ano passado.

Mas em 2006 a Record começava a demandar uma flexibilidade maior em sua relação com a Vênus Platinada, mas a emissora dos Marinho se mostrava irredutível numa possível renegociação. A situação foi evoluindo de tal maneira que ao final de 2006 Record e Globo romperam relações e não mais seriam parceiras. Aí então a emissora dos bispos resolveu colocar suas mangas de fora.

Edu Zebini (diretor de esportes da Record) mirou diretamente em dois eventos de grande valor no interesse futebolístico: o Campeonato Paulista e a Copa do Mundo. Pelo Paulista a Globo inicialmente ofereceria 40 milhões de reais, a Record veio com 70 milhões. O fato é que mesmo com o valor menor quase todos os clubes do campeonato preferiram aceitar o acordo da Globo. Mas um grupo liderado pelo São Paulo fez com que a Globo tivesse que suar um pouco e ao menos igualar a proposta da Record. Assim foi feito, a Globo pagou os mesmos 70 propostos pela Record e acabou levando a competição. Apesar disso, a Record conseguiu levar os direitos do Catarinense, Baiano e Parabiano. Campeonatos estes que são líderes de audiência em seus estados.

Já no caso da Copa do Mundo a diferença de propostas foi ainda maior. A Record acenou com 180 milhões de dólares e a Globo com 120. Mas no final das contas a Globo acabou levando as Copas de 2010 e 2014. A justificativa da FIFA foram fatores como a maior cobertura da Globo em território nacional (99% contra 70% da Record), a audiência média que é cinco vezes maior e que caso a Copa de 2014 seja realmente em terras tupiniquins os patrocinadores da FIFA teriam uma maior visualização.

Essa vitória nos Jogos Olímpicos trouxe mais fôlego a Record nessa batalha contra a Vênus. Mostra que eles tem cacife, e muito. Mas este escriba pergunta se justamente não é esse o problema. Até que ponto é ético que o dinheiro da Record provenha de uma instituição que não paga impostos e que conta com a devoção religiosa ao seu lado? Lembrando que essa batalha não é apenas no âmbito esportivo mas está no mercado televisivo como um todo. E na opinião deste que vos escreve isto é preocupante.


PS: Este colunista pede desculpas por sua ausência de uma semana e promete que isso não mais se repita.

-TC Muniz Relvas